RÉSUMÉ
Resumo As teorias e concepções dominantes sobre desenvolvimento humano e infância, produzidas a partir de uma ótica moderna-colonial, têm contribuído tanto para invisibilizar as diversas infâncias, quanto para dar sustentação à incessante medicalização no campo do cuidado infantil. Neste ensaio, propõe-se discutir as relações estruturais e invisíveis entre a colonialidade e patologização, problematizando alguns dos efeitos desse processo na prática cotidiana do cuidado à infância. No plano teórico-reflexivo, nutrido através do diálogo com autoras/es contemporâneas/os alinhadas/os com a inflexão decolonial, o texto endossa a crítica à teoria hegemônica de desenvolvimento infantil, fundada nas noções de evolução-progresso-hierarquia e, claramente, na universalização de seus fundamentos. O texto avança apontando evidências de que a reprodução de tais fundamentos tem sido determinante para o processo em curso de patologização da infância. No plano empírico, a análise de uma situação concreta envolvendo a colaboração entre creches e um dispositivo de saúde mental dirigido à infância revelou que a adoção de uma abordagem sensível e contextualizada frente aos "incômodos" produzidos pela criança pode contribuir para romper o ciclo de exclusão, invisibilidade e negatividade, vivenciado por muitas crianças e suas famílias. A experiência relatada demonstrou, ainda, que é possível produzir práticas descolonizadoras nos serviços de atenção às infâncias.
Abstract The dominant theories, and conceptions of human development and childhood, produced from a modern-colonial perspective, have contributed both to making different childhoods invisible and supporting the incessant medicalization in the field of childcare. In this essay, we propose to discuss the structural and invisible relationships between coloniality and pathologization, problematizing some of the effects of this process on the daily practice of childcare. On a theoretical-reflexive level, nurtured through dialogue with contemporary authors aligned with the decolonial inflection, the text endorses the critique of the hegemonic theory of child development, based on the notions of evolution-progress-hierarchy and, clearly, on the universalization of its foundations. The text goes on to point to evidence that the reproduction of these foundations has been a determining factor in the ongoing process of pathologizing childhood. On an empirical level, the analysis of a concrete situation involving collaboration between nurseries and a mental health service aimed at children revealed that adopting a sensitive and contextualized approach to the "discomfort" produced by children can help break the cycle of exclusion, invisibility, and negativity experienced by many children and their families. The experience also showed that it is possible to produce decolonizing practices in childcare services.