A violência doméstica contra a criança e o adolescente e o ensino de pediatria na residência médica / Domestic violence against children and adolescent and pediatric residency training

RESUMO

A violência é tema de maior relevância por ser causa de sofrimento, adoecimento e mortes evitáveis; na infância e adolescência é certamente o pediatra o profissional que muitas vezes se depara com suas diversas conseqüências. Este estudo tem como objetivo descrever e analisar como a violência doméstica contra crianças e adolescentes (VDCA) está sendo apreendida e transformada por residentes de pediatria. Metodologia: Foi realizado um estudo transversal no município de São Paulo, envolvendo uma amostra não aleatória de 67 residentes, inseridos em 9 dos 15 programas existentes. Na 1ª etapa, os residentes preencheram um questionário semi-estruturado com um caso clínico, para o qual deveriam levantar hipóteses diagnósticas e descrever encaminhamentos, dificuldades do atendimento, as oportunidades de aprendizado e o papel do pediatra. No 2º momento foram realizadas 9 entrevistas em profundidade com uma sub-amostra, visando aprofundar questões apontadas no questionário. Resultados: Em relação ao caso apresentado, 80% dos residentes suspeitou de síndrome de maus tratos, a metade reconheceu a hipótese de bebê sacudido, e 85% deles conduziu a criança para o serviço social, Conselho Tutelar ou Justiça. O seguimento ambulatorial foi lembrado por 55% dos residentes e para a família por apenas 22% deles. Nenhum residente levantou a possibilidade de tratamento para o perpetrador. A preocupação com o risco de vida foi reconhecida por 41,8%. À respeito das dificuldades em trabalhar o tema, 68% dos residentes expressaram sentimentos e atitudes que se distribuem em polaridades como medo e onipotência. Quanto à notificação da suspeita de VDCA, metade a reconheceu como atribuição do pediatra e 15% apontou o relatório médico como uma das formas de efetivá-la. Apesar dos residentes terem mencionado diversas oportunidades de contato com o tema, 83% caracterizou a formação como insuficiente. Diagnosticar VDCA foi a atribuição do pediatra mais reconhecida pelos residentes (64%), mas poucos reconheceram o seu papel no tratamento (13%). Com relação à prevenção da VDCA, também poucos se posicionaram e, os que o fizeram, reconhecem que não estão preparados. Conclusões: há etapas importantes do atendimento da criança sob risco de violência que podem ser melhoradas. Para tanto, questões específicas do próprio residente, entre elas o medo, devem ser destacadas na sua formação, para que ele possa ser preparado para reconhecer a criança na sua alteridade e desempenhar melhor o seu papel