Fluoreto e inteligência: avaliação crítica de um estudo de coorte prospectivo / Fluoride and intelligence: critical assessment of a prospective cohort study

RESUMO

Introdução: A fluoretação da água é considerada uma estratégia eficaz e segura para a prevenção de cárie dentária. Contudo, com base em um estudo de coorte realizado no Canadá que avaliou a associação entre exposição de gestantes a fluoreto (F) e inteligência (QI) da prole aos 3/4 anos de idade, publicações alarmistas nas redes sociais têm divulgado que o F adicionado à água reduz a inteligência de crianças. Objetivo: Avaliar a qualidade da evidência sobre exposição à F e inteligência proporcionada por esse estudo. Apresentar as principais características do estudo seguida de análise crítica da evidência. Síntese dos dados A concentração de F na água consumida pelas gestantes expostas à água fluoretada foi 4,5 vezes maior do que na água consumida pelas gestantes que viviam em região sem água fluoretada; o escore médio de QI das crianças dos dois grupos foi o mesmo. Houve associação estatisticamente significante entre excreção urinária materna de F e menor QI de meninos. O aumento de 1 mg F/l na ingestão autorrelatada de F materna foi associado a um decréscimo de 3 pontos no QI da prole. A análise crítica identificou risco de viés de seleção e de informação e confundimento residual, com potencial de comprometer a validade dos resultados. Conclusão: O estudo não proporciona evidência robusta sobre exposição ao fluoreto e diminuição da inteligência. Sua conclusão não deve ser extrapolada como suporte científico para propostas de mudanças na fluoretação da água de abastecimento público.

ABSTRACT

Introduction: Water fluoridation is considered an effective and safe strategy for preventing dental caries. However, based on a cohort study conducted in Canada that evaluated the association between exposure of pregnant women to fluoride (F) and intelligence (IQ) of offspring at 3/4 years of age, alarmist publications on social networks have reported that F added to water reduces children's intelligence. Objective: To evaluate the quality of the evidence regarding exposure to F and intelligence provided by this study. To describe of the study's main characteristics followed by critical appraisal. Synthesis of data The concentration of F in water consumed by pregnant women exposed to fluoridated tap water was 4.5 times higher than in water consumed by pregnant women not exposed to fluoridated tap water; mean IQ score of the children in the two groups was the same. There was a statistically significant association between maternal urinary excretion of F and lower IQ in boys. The increase of 1 mg F / l in the self-reported intake of maternal F was associated with a decrease of 3 points in the offspring's IQ. We identified the risk of selection and information bias, as well as potential for residual confounding, which might have affected the validity of the results. Conclusion: the study does not provide robust evidence on exposure to fluoride and impaired intelligence. Its conclusion should not be extrapolated as scientific support for proposals for changes in the fluoridation of public water supply.