Sentidos da violência. A trajetória do Fórum Social de Manguinhos (2007-2016) / Meanings of Violence. The trajectory of the Social Movement Forum of Manguinhos (2007-2016)

RESUMO

Esta dissertação busca descrever diferentes configurações de atores sociais em seus rearranjos após intervenções do poder público no Complexo de Manguinhos. Pretendemos com isso identificar os sentidos atribuídos à violência que mobilizam a ação coletiva em um cenário de arbitrariedades de atuação do Estado e progressiva militarização do território da favela. Dois grandes eventos promoveram reorganizações dos atores sociais nas favelas do Complexo de Manguinhos a inclusão no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a instalação de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Podemos identificar três momentos de reconfiguração de atores coletivos deste território no período estudado. Na primeira configuração (2007-2009), o Fórum Social de Manguinhos (FSM) foi constituído a partir da mobilização dos moradores para o acompanhamento das intervenções do PAC e posteriormente tornou-se espaço de denuncia da arbitrariedade estatal, após a retirada do Estado das mesas de negociação. A segunda configuração (2009-2012), quando, após ameaças a alguns de seus membros e a desmobilização dos moradores, o FSM se afasta do acompanhamento direto do PAC e busca criar novas estratégias de atuação em Manguinhos. Nesse período com a assessoria da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/FIOCRUZ), nas reuniões do FSM foram discutidas a criação de outros coletivos como o Conselho Comunitário de Manguinhos (CMM) e o Conselho Gestor Intersetorial (CGI) do TEIAS-Escola Manguinhos. A terceira configuração (2013-2016) foi marcada pela implantação da UPP no território. O FSM retomou sua atuação de denúncias das arbitrariedades cometidas pelo Estado, nesse momento através da violência policial. Acolheu também em suas reuniões mulheres que tiveram seus filhos mortos por agentes da UPP, dando apoio a constituição do coletivo Mães de Manguinhos. O FSM pautou sua atuação a partir de diferentes sentidos atribuídos à violência, conforme as inflexões de sua trajetória da demanda pelas condições estruturais de urbanização que contribuíam para um cenário de violências, passando pela violência estatal que desconsidera a voz dos moradores para intervir no território, chegando à denúncia da violência policial e do racismo estrutural que torna os moradores da favela vítimas seletivas. Para empreender essa tarefa travei diálogo com as Ciências Sociais, especialmente com os estudos sobre violência urbana e associativismo social. Realizei a análise de documentos elaborados pelo Fórum Social de Manguinhos no período e entrevistas em profundidade com uma ex-integrante e dois atuais integrantes do Fórum Social de Manguinhos. (AU)

ABSTRACT

This study seeks to describe distinct configurations of social actors and their rearrangements after State interventions in Manguinhos Favela Complex. We intend to identify the meanings assigned to violence that urges collective action in the context of State abuse and the militarization of favela territory. Two major events promoted the rearrangement of social actors of Manguinhos Favela Complex the selection of Manguinhos to receive the government´s Growth Acceleration Plan (Programa de Aceleração do Crescimento ­ PAC) and the inauguration of a military unit of proximity law-enforcement, named Pacifying Police Unit (Unidade de Polícia Pacificadora ­ UPP). We can identify three moments of reconfiguration of social collectives on Manguinhos. In the first configuration (2007-2009), the Social Movement Forum of Manguinhos (Fórum Social de Manguinhos ­ FSM) was assembled by Manguinhos dwellers trying to interfere in the Growth Acceleration Plan interventions. Later, after the State withdrawal from negotiations, the FSM becomes a place to denounce State abuse. In the second configuration (2009-2012), after some members of FSM were threatened and the demobilization of Manguinhos dwellers, FSM departed from follow-up PAC interventions, and seeks new strategies to act in Manguinhos. In this period, with the assistance of the National School of Public Health (Escola Nacional de Saúde Pública ­ ENSP), FSM meetings were used to discuss the creation of other collectives in Manguinhos. The third configuration (2013-2016) was marked by the UPP inauguration. FSM resumed the denouncement of State abuse, now through police violence. FSM also welcomed mothers of juveniles murdered by cops in its meetings, giving support for the assembling of a new collective, Mothers of Manguinhos. FSM guided it actions by different meanings assigned to violence according to the inflections in its trajectory, from structural conditions of urbanization that contributed to a scenario of violence to State abuse by police violence and structural racism. To do this research, I dialogued with studies in urban violence and social associativism, analyzed FSM public documents, and interviewed members and former members of FSM. (AU)